Sunday, November 26, 2006

Gota de Sofia com e.e. cumings - Se For Assim


Talvez não seja bem assim; mas digo
que se teus lábios, que eu amei, beijarem outro,
e teus dedos fortes agarrarem seu coração,
tal como foi comigo; se teus cabelos noutra tez roçarem
num silêncio que eu sei, ou se contigo
no ardor de frases tensas se agitarem
como indefesa e acuada ante o perigo;
se acaso for assim, ah! se assim for -
tu que és minh'alma, dize-me que irei
em busca desse alguém, mãos estendidas,
dizer-lhe: Sê feliz com meu amor.
Na volta, ao longe, um pássaro ouvirei
cantar nas terras para mim perdidas.

Nota de Sofia: Edward Estlin Cummings foi um dos papas da poesia moderna e pintor de talento.

Gotas de Sofia com Shakespeare - Monólogo de Hamlet



Ser ou não ser... eis a questão.
Se mais nobre à razão é suportar
frundas e frechas da afrontosa sorte
ou tomar armas contra um mar de opróbrios
e enfrentando-o acabar? Morrer, dormir;
não mais? E imaginar que em sono acabam
mil dores d'alma e os naturais conflitos
herdados pela carne... eis um epílogo
de ansiar-se com fervor. Morrer, dormir.
Dormir: sonhar, quem sabe? Eis o impasse.
Nesse sono da morte vir-nos sonhos,
depoi de livres do mortal invólucro,
nos faz deter. E tal cogitação
nos transforma em flagelo a longa vida.
Pois quem sofrera os látegos do tempo,
ultrages do opressor, o ar do arrogante,
os ais do ingrato amor, da lei delongas,
a insolência do mando, as rejeições
que o mérito paciente tem do indigno,
se ele próprio pudesse resgatar-se
com a adaga nua?

Quem levara fardos,
gemendo e suando numa vida insulsa,
senão que o medo de algo após a morte
- Inachado país de cujas raias
viajante algum voltou - enreda o intento
e nos faz preferir nossas misérias
a voar para outras mais que não sabemos?
Assim nos faz covardes a consciência
e a primitiva cor da decisão
dilui-se ante o palor do pensamento,
e as empresas de alcance e de visão
desviam-se por isso do seu curso
e perdem o nome de ação.

Nota de Sofia: Existe um texto do apóstolo Paulo em que ele se diz indeciso entre a vida e a morte. Não sabe qual o melhor, embora considerasse que ir para Deus houvesse completa felicidade. A diferença entre Paulo e Hamlet, é que Hamlet acha viver doloroso, e covarde quem prefere ficar aqui, mesmo com todo os "flagelos". Hamlet acha viver puro masoquismo involuntário, viver, para ele, era um ato de covardia, não o suicídio, ou seja, para Hamlet, suícidio era decidir viver.
Paulo vê a ato de viver como oportunidade de fazer um mundo melhor. Ele não tem nenhum romantismo quanto ao mundo, mas julga que se todo ser humano decidisse viver com qualidade, ou seja, viver para Deus e servi-lo, a morte perderia sua força e morrer seria doce porque saberíamos para onde estaríamos indo. Por isso, o apóstolo diz que para ele "morrer é lucro".
A ilustração é uma tela de Rembrandt.

Colcha de Retalhos de Sofia - Fragmentos de Oscar Wilde Sobre Jesus em "De Profundis"




Jesus foi a primeira pessoa a dizer que os homens deveriam viver vidas como as das flores. Tomou as crianças como exemplo daquilo que as pessoas deveriam tentar ser. Ele as apontava como exemplos para os adultos (...) Ele acreditava que a vida era algo mutável, fluido, ativo, e que permitir que se tornasse esteriotipada seria a morte.
Entendeu também que as pessoas não deveria se preocupar demais com as coisas materiais, que o fato de não ter senso prático poderia ser uma qualidade, que ninguém deveria pensar demais nos seus próprios problemas. Se os pássaros não se preocupam, por que deveria o homem preocupar-se? (...)
Cristo amava os ignorantes, pois sabia que na alma do ignorante há sempre lugar para uma grande idéia. Mas não suportava os estúpidos, especialmente aqueles que a educação tornara ainda mais estúpidos: gente cheia de opiniões e que não consegue entender uma só delas, um tipo de gente particularmente moderna, que Cristo resumiu bem quando descreveu como o tipo da pessoa que possui a chave do conhecimento, mas não sabe como usá-la nem permite que outras pessoas a utilizem, embora com ela pudessem abrir as portas do Reino dos Céus.

Nota de Sofia: Oscar Wilde escreveu De Profundis na prisão onde, pela primeira vez, leu os quatro Evangelhos e ficou profundamente impressionado com a pessoa de Jesus Cristo. De Profundis só foi publicado após a morte do autor, por pedido do próprio. Foi escrito em 1896, publicado em 1905 e trata-se de cartas nunca entregues a Lord Douglas, amante de Oscar e o motivo de sua prisão.
A ilustração é uma tela de Salvador Dali.

Saturday, November 25, 2006

Gota de Sofia com Lêdo Ivo - O Olhar de Deus



A escada do bordel range sob nossos pés.
Na poeira do tapete esfiapado
oculta-se o olhar de Deus.
Não somos dignos
de ter a Altíssima testemunha
na hora em que pecamos.
melhor fora que nenhum Deus
nos observasse quando fornicamos
ou quando, após o coito,
acendemos um cigarro.
Não somos dignos de piedade.
Melhor fora que Deus não existisse
e vivêssemos todos fora
de seu olhar incômodo.


Nota de Sofia: "Os olhos do Senhor estão em todo lugar, contemplando os maus e os bons" (Pv 15:3)

Minha Pretenciosa Gota de Sofia


Lembro-me claramente do quarto de minha avó.
Posso sentir o cheiro suave do talco, espalhado no ar.

Cheiro que contrastava com a velha e austera cômoda num canto de parede.
A cama, com seu colchão que lembrava nuvens – devido a maciez – era coberta com uma colcha de retalhos, pedaços de panos que agora, comparo com minha vida nas mãos de Jesus: restaurada e útil.

Gota de Sofia com Leandro de Castro



AMIGOS x LIVROS
Devemos buscar amigos como buscamos livros.

Acertar na procura.
Não exija que sejam muitos, mas que sejam bons.
Não exija que sejam ricos, mas que sejam fiéis. Não exija que tenha boa profissão, mas sim de bom coração.
É triste o homem que não pode buscar livros por não saber lê-los.
Mas é ainda mais triste o homem que não pode buscar amigos por não saber conquistá-los.
É triste a estante vazia por falta de livros, mas é ainda mais triste o homem oprimido por falta de amigos.
Os livros nos tiram da turbulência da alma, nos fazem refletir sobre grandes acontecimentos, Mas o amigo converte tormentas e tempestades em chuva de sentimentos.
Não podemos chamar de rico o homem que não tem livros,
Mas podemos afirmar que é mendigo o homem que não tem amigos.

Nota: Este é o PG (Pequeno Grupo). Ainda faltam algumas pessoas MUITO importantes, mas brevemente estarão aqui conosco. Amo esse povo. Que Deus seja com cada um.

Friday, November 24, 2006

Gota de Sofia com Drummond e de Beleza com Mirna


Cariocas
Como vai ser este verão, querida, com a praia, aumentada/ diminuída?
A draga, esse dragão, estranho creme de areia e lama oferta ao velho Leme.
Fogem banhistas para o Posto Seis, O Posto Vinte...
Invade-se Ipanema hippie e festiva, chega-se ao Leblon e já nem rimo, pois nessa sinuca superlota-se a Barra da Tijuca

(até que alguém se lembre de duplicar a Barra, pesadíssima).

Ah, o tamanho natural das coisas estava errado!
O mar era excessivo, a terra pouca.
Pobre do ser vivo, que aumenta o chão pisável, sem que aumente a própria dimensão interior.
Somos hoje mais vastos? mais humanos?
Que draga nos vai dar a areia pura, fundamento de nova criatura?
Carlos, deixa de vãs filosofias, olha aí, olha o broto, olha as esguias pernas, o busto altivo, olha a serena arquitetura feminina em cena pelas ruas do Rio de Janeiro que não é rio, é um oceano inteirode (a) mo (r) cidade.

Uma pequena/grande homenagem à minha amiga Mirna que esteve no Rio e deixou-o mais belo por uns dias.

Gota de Sofia com René Depestre


Todos os Reconhecem
Em todos os cantos do mundo.
Os reconhecem
Pelo leite que emana de seu riso;
Os reconhecem
Por seu coração dilacerado,
Por seus músculos em repouso.
Os reconhecem
Por suas pernas delgadas,
Seus pulsos de rijo metal,
E pelos rouxinóis que em suas gargantas fazem ninho.
Em todos os cantos do mundo.
Negros de tristes tempos

Gota de Sofia com Charles Baudelaire


É impossível percorrer uma gazeta qualquer, seja de que dia for, ou de que mês, ou de que ano, sem nela encontrar, a cada linha, os sinais da perversidade humana mais espantosa, ao mesmo tempo em que as gabolices mais surpreendentes de probidade, de bondade, de caridade, e as afirmações mais descaradas a respeito do progresso e da civilização. Os jornais, sem exceção, da primeira à última linha, não passam dum tecido de horrores. Guerras, crimes, roubos, impudicícias, torturas, crimes dos príncipes, crimes das nações, crimes dos particulares, uma embriaguez de atrocidade universal. É com esse repugnante aperitivo que o homem civilizado acompanha a sua refeição de cada manhã. Tudo, nesse mundo, transpira o crime: o jornal, a muralha e o semblante do homem. Não compreendo que uma mão pura possa tocar num jornal sem uma convulsão de repugnância.

Nota de Sofia: Pode-se dizer o mesmo da televisão

Gota de Sofia com Rabindranath Tagore

O REBELDE
Quando O magoei, mesmo sem saber, me aproximei de Você.
Quando lutei com Você, derrotado, finalmente O aceitei como mestre.
Quando furtivamente O roubei, tornei oneroso meu débito com Você.
Lutei orgulhosamente com Sua correnteza, apenas para sentir Sua força em meu peito.
Rebelde, apaguei a luz de minha casa, e Seu céu me surpreendeu estrelado.

Gotas de Sofia com William Blake

"Enquanto os outros viam o sol se pondo por detrás da colina,
eu via os filhos de Deus gritando de alegria"


O Menininho Perdido
Meu pai, meu pai, para onde vai?
Ai, não caminhe tão apressado
Fale pai, fale ao teu menino
Ou logo estarei abandonado,
A noite era escura, nenhum pai presente
A criança de orvalho molhada,
O charco fundo, a névoa subia lentamente
E a criança soluçava.
O Menininho Encontrado
O menininho no charco solitário,
Tangido pela luz bruxuleante,
Começou a chorar, mas Deus a noite
Surgiu-lhe como um pai aconchegante
Ele beijou a criança e pela mão
Trouxe-a de volta à mãe, que bem cedinho,
Já pálida de dor, no ermo do vale,
Buscava soluçando o menininho.

Minha Pretenciosa Gota de Sofia


A Psicologia do Lavar Pratos

É bom lavar pratos. Eu gosto. Gosto de sentir a água fria escorrendo pelas mãos. Inventaram a máquina de lavar louça; ainda bem que não pegou, ou seja, ainda bem que esse acessório que eu considero absolutamente fútil, não barateou o suficiente para que a população se interessasse em comprar. Seria mais uma vitória da máquina sobre o homem.
Lavar pratos é terapêutico. A compra dessa máquina retiraria todo o prazer das donas-de-casa que já tem a vida tão difícil. Elas deviam descobrir o prazer que há numa lavagem de pratos, mas infelizmente só conhecem a obrigação de lavar a louça após o almoço, o que dificulta na percepção do prazer. Experimente ir para a pia lavar pratos ouvindo uma boa música. Experimente fazê-lo sem o estigma da obrigação (é um recado para as donas-de-casa).
Conheço duas maneiras de saber o que uma pessoa pensa da vida lavando pratos em sua casa ou estando ao seu lado enquanto dirige o carro.
Faço sempre esse teste; é tiro e queda. Mas faço sempre com amigos, é claro, com pessoas que tenho um certo grau de intimidade.
Quando, estando eu na casa de amigas, após o almoço, vou para a pia na intenção de lavar a louça, as reações são as mais diversas. Cada reação mostra um pouquinho do que há no coração daquela pessoa.
Tenho uma amiga que todas as vezes que vou em direção à sua pia e pego nos pratos para os lavar, ela diz: “Não, Rosane, nem pensar”. Observo então que para ela, lavar pratos alheios é, digamos, uma ação diminutiva. Ou o dono dos pratos os lava por obrigação ou paga-se uma profissional para o ato. Visita é visita. Não há intimidade. Seu coração está cheio de desconfianças, portanto, receber ajuda de alguém, para ela, é um horror.
Na casa de outra, lavar os pratos é uma forma de pagamento. Quem lava é a pessoa que não cozinhou, mas comeu. Ela sempre me olha com o seguinte argumento no olhar: “Bem, eu cozinhei, você lava”. Me ofereço e me arrasto para a pia com a sensação de todas as donas-de-casa. Por uns momentos lavar pratos se torna chato e cansativo, até que começo a sentir a água em minhas mãos e aí vem o prazer. É uma pessoa rígida, exigente e cheia de modelos humanos.
Já na casa de outra, da Neide, lavar pratos é uma comunhão. Sinto cumplicidade, irmandade. Amo sua pia. Sinto-me morando em sua casa, fazendo parte da família. Não existe obrigação, não há desconforto. Pode lavar os pratos quem quiser. Quando ela diz: “Deixa aí Rô!”, é pelo simples fato de querer ficar na mesa estendendo a conversa , nada mais.
Lavar pratos na casa das minhas amigas Neide e Neuma é, também, lavar a alma.

Minha Pretenciosa Gota de Sofia


Antes da Flor, a Chuva.

Eu e uma amiga conversávamos sobre o lado emocional do ser humano e ela falou da curiosidade em saber porque as pessoas se desestruturam tanto quando afetadas no lado emocional.
Quando sofremos por estarmos enfermos ou por passarmos dificuldade financeira, sempre tem alguém que nos ajuda e assim nos sentimos amparados de alguma maneira, mas quando a dor é puramente emocional –como por exemplo, uma rejeição amorosa ou a perda de alguém por morte – os amigos, as palavras não parecem fazer efeito. A dor é tão profunda que a solidão é a melhor companheira. Tudo perde o sabor, a cor.
Ao enfrentarmos este tipo de problema começamos a entender o valor do tempo e agradecemos a Deus em silêncio. O tempo é um bisturi nas mãos do Criador, são gotas de bálsamo irrigando feridas. Caetano disse em uma de suas músicas que o tempo é compositor de destinos. Acho que o nobre poeta enganou-se, o tempo são notas musicais nas mãos do verdadeiro compositor de destinos.
A Bíblia diz que há tempo para tudo. É verdade. Não adianta querermos adiantar ou atrasar os acontecimentos, o relógio de Deus funciona diferente.
Todos conhecem o El Ñino, fenômeno que desestrutura as estações. O verão se mete no inverno, o outono quer tomar o lugar do verão, chove onde não deve chover, faz calor onde há necessidade de estar frio, e por aí vai.
No mundo espiritual não existe El Ñino. Época de chuva é chuva, de flores, flores. Se tivermos que passar por rigoroso inverno, passaremos. Mas o mundo espiritual é também um mundo de esperança. O salmo 30:5 diz que “o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã”. Chove, mas haverá flores, e para que elas nasçam, é preciso chover.
Eis um poema do Lêdo Ivo, chamado A Tempestade. A poesia sempre explica melhor:
“Para que os cajueiros possam florir, caiu esta chuva/que apagou as estrelas e encharcou os caminhos/água e vento derrubaram cancelas antigas, quebraram telhas, vergaram árvores, suprimiram cercas, desalojaram abelhas e maribondos, enxotaram os pássaros predatórios e o galinheiro é um cemitério de pintos amarelos. /Este é o regimento do mundo: relâmpagos e raios antes da flor e do fruto”.

Gotas de Sofia com Mário Quintana:


PÉ ANTE PÉ
"Vem todos caminhando na ponta dos pés.
Alguém morreu? Não.
É mais fundo o mistério...
Chegam todos, agora, na ponta dos pés,
Para vê-lo dormir o primeiro soninho".

"O céu é dos sábios; o mundo, dos sabidos"

"Canibalismo é a maneira exagerada de apreciar o seu semelhante".

"Não importa o enredo das histórias: o que vale é o êxtase de quem escuta..."

"A coisa mais triste deste mundo é um cachorro sem pulgas".

"O problema da solidão não consiste em saber como solucioná-la, mas em saber como conservá-la".

"O aborto não é, como dizem, um assassinato. É um roubo. Não pode haver roubo maior. Porque, ao malogrado naciturno, rouba-lhe este mundo, o céu, as estrelas, o universo, tudo! O aborto é o roubo infinito".

"Os que agem com segundas intenções não conseguem enganar ninguém. Está na cara... O perigo mesmo - porque é invisível - está nos que tem terceiras intenções".

SLOGAN PARA O MINISTÉRIO DA
SAÚDE:
"O fumante é
um retardado que ainda não conseguiu deixar de mamar".

"Teologia é o caminho mais longo para chegar a Deus"

"Falam muito do Sono Eterno. Sempre falaram, aliás... E daì?

Daí, só uma coisa me impressiona, e muito: a ameaça de uma Insônia Eterna".

"Digam o que disserem, mas a Lua continua sendo o LSD dos poetas".

"A gente deve atravessar a vida como quem está gazeando a escola e não como quem vai para a escola".

"Há criaturas que não vivem; apenas estão fazendo hora para morrer".



Nota de Sofia: A criança na foto chama-se Ana Beatriz. Não é linda?