Passei um final de semana na pousada Vale dos Ventos, na Serra de Maranguape; um lugar muito bonito, com muito verde e cheinho de pássaros e pavões. Cheguei à noite, e depois de comer uma deliciosa salada de verduras, achei que cairia num sono profundo e que ouviria apenas o soprar do vento nas folhas das árvores, mas qual o quê. Quando deitei, banho tomado, corpo relaxado, barriga cheia, começou o barulho da “insetaria”, como chama a Adélia Prado (achei essa palavra fantástica). Era um barulho de entorpecer os tímpanos. Parecia um trânsito louco de insetos, uma farra dos pequenos seres, um som ensurdecedor. Eu pensei: “Meu Deus, deve ser entrada de Ano Novo ou Carnaval na mata!” Pois sim.
Bem cedinho da manhã, clareando o dia, os pássaros (centenas), galos e pavões não deixaram por menos, não quiseram ficar por baixo e haja cantoria. Adeus sono! Tinha um canto esquisito, estranho, apesar de bonito, que eu nunca havia ouvido na vida, um grito fino, muito fino, como se fosse o Tarzan gritando “gooooool”. De arrepiar. Pela madrugada, lá pelas tantas, quando meus ouvidos se adequaram ás vozes da insetaria, veio o barulho dos meus pensamentos na “calada” da noite. Eles faziam zoada igual aos insetos, ou pior, já que pensamentos trazem emoções que fazem barulho no coração e que doem nos tímpanos da alma.
Meditando esses sons, cheguei á conclusão que não existe silêncio nenhum nesse mundo, cada lugar tem o seu barulho.
Filosofando intimamente, levantei pra ir ao banheiro. Sonolenta, liguei a luz e sentei no sanitário. Dei uma olhadinha de lado, aquele olhar aleatório e, bem no cantinho da parede, debaixo do chuveiro, quieto e silencioso, estava um sapo, um cururu enoooorme. Cururu não precisa fazer barulho, né? O visual dele, em si já é uma orquestra assustadora. Bem, eu já estava sentada, fazendo meu xixizinho básico da madrugada, quando vi o dito cujo, com aqueles olhões me paquerando. Fiz um movimento brusco e ele se esquivou humildemente, se enfiando mais no canto da parede. Entendi que ele e eu estávamos com medo um do outro, então pensei que ele poderia vir pra cima de mim numa atitude de autodefesa; aí tratei de ter um diálogo: “Olha, colega, eu sei que você está com medo de mim e eu de você, portanto, vou sair bem devagar. Num se preocupa, não, viu? Sou do bem, amo os animais, essa invenção maravilhosa de Deus, principalmente os sapos!” Ele continuou me olhando e eu continuei sem coragem de levantar. De repente, o medo foi passando e o aspecto do sapo foi mudando aos meus olhos. Ele me pareceu tão frágil, tão indefeso e tão bonito que tive vontade de tocá-lo. Continuava quieto e acho que o meu aspecto também deve ter mudado aos seus olhos, deve ter me achado frágil, indefesa, até bonita e também deve ter tido vontade de me tocar. Perdeu o medo dos humanos e eu perdi o medo dos sapos.
Entre pessoas acontece o mesmo. Julgamos uns aos outros, elaboramos opiniões pré-conceituosas, reparamos nos “aspectos”, até o dia em que nos deixamos aproximar e descobrimos que aquela pessoa não é horrenda e nem feia como pensávamos; muito pelo contrário, descobrimos que é um ser humano frágil, muitas vezes indefeso e de uma beleza interior surpreendente.
Saí do banheiro na maior tranqüilidade, rindo para o meu mais novo amigo. Voltei pra cama feliz, certa de que agora conseguiria dormir, mas qual o quê. Quando estava fechando os olhos para adentrar no mundo dos sonhos, ouvi um grito estridente e apavorante. Era o grito de uma amiga que entrara no banheiro pra fazer o xixizinho básico e sagrado da madrugada, e que, sentada no sanitário, sonolenta, resolveu dar aquele olhar aleatório para o canto da parede.
5 comments:
Olá,Rô!muito pertinente a sua dissertação sobre pré julgamentos.Somos exatamente assim,e é por isso que, muito frequentemente,deixamos de conhecer pessoas fantásticas.
Quem dera existissem mais e mais pessoas com a sua sensibilidade e o seu natural e aguçadíssimo dom de observar as coisas mais simples e tirar preciosas lições de vida delas.
Que o bom Deus abençoe voce mais e mais,minha amiga!
P.S:Confesso que preciso "repensar" os sapos,pois ainda não consegui vencer o pensamento "preconceituoso" de que eles são meio...asquerosos!Morro de medo deles e das geladas rãs!Rs..
Prometo "tentar" pensar neles de forma diferente (vai ser difíííícil!!!!Rss).
Beijo!
Convem observar,ouvir,olhar mais vezes e por dierentes ângulos. Seria bom que fizéssemos isso antes de julgar ou rotular alguém.As surpresas podem acontecer e ser positivas ou negativas.É,se os sapos podem revelar beleza ao serem vistos sem reservas,também as pessoas dotadas de discursos bonitos na sua retórica habitual podem esconder fraudes.Observar atentamente e sem pressa:acho que esse é o caminho para um olhar mais lúcido sobre os outros.
Agora,quanto aos sapos,nada de buscar a sua essência.Eu mooorro de medo de qualquer anfíbio.Não vou "repensar os sapos" como nossa amiga Iris disse DE FORMA ALGUMA.
Sem chance!
rsrsrs
Maravilhoso!!!
A família Vale do Vento agradece!!!
Parabéns pelo dom de descrever tão perfeitamente tudo isso.
Que Deus te abençoe hoje e sempre...
Abraço.
Jeize Andrade.
(Informações /Reservas)
www.valedovento.com
32263465 / 88476678
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